Um dos jardins de Jiading, na China
Eu e meus amigos na F-1 temos uma mania. De tempos em tempos gostamos de fazer listas dos cinco GPs que tiraríamos do calendário. Ou dos cinco que colocaríamos de volta. Ou dos cinco inéditos que colocaríamos.
Na minha lista, a China sempre esteve no top 3 dos dispensáveis. Ok… minha primeira vez em Xangai, em 2007, foi uma tragédia. Primeira temporada, conhecia pouca gente, resolvi aceitar o conselho de um colega e optei por ficar em um hotel no centro da cidade, que não estava entre os listados pela organização…
Ah, se arrependimento matasse! O colchão da cama parecia de pedra, não de espuma. Para tomar café da manhã era sempre um drama, ninguém me entendia e eu acabava voltando para o quarto em jejum. Pegar um táxi para o circuito era uma aventura à parte. Nenhum motorista tinha ouvido falar de F-1, circuito ou qualquer coisa parecida. Depois do primeiro dia, quando memorizei o caminho, comecei a dar instruções para os próximos, sempre em português, porque se eu falasse em inglês, russo ou esperanto daria na mesma.
Lembro da noite de domingo, depois daquela corrida inesquecível, quando Hamilton, que lutava pelo título, atolou na caixa de brita na entrada dos boxes (cruzei a sala de imprensa voando para ver, lá de cima, do oitavo andar _parênteses aqui para dizer que a sala de imprensa em Xangai é a melhor da F-1, pois fica em cima da reta de largada e dá uma visão de boa parte da pista), cheguei morta no hotel e tudo que queria era pedir serviço de quarto, comer e dormir.
Obviamente que ninguém me entendeu. Lembro de estar no telefone com meu pai, aos prantos, esgotada, quando um amigo bateu na porta com um McFish e batatas fritas. Chorei ainda mais. #prontocontei
No ano seguinte resolvi ficar perto da pista _Xangai fica cerca de 40 km do circuito, mas o problema é o trânsito, que deixa o de São Paulo parecer bom… E as coisas melhoraram. Mas não muito. O shuttle que nos levava à pista era sujo, os motoristas mal educados, ninguém falava inglês. O caminho para o circuito não ajudava, era cheio de sujeira e construções.
Mas a gota d´água para eu decretar ódio mortal pela China veio em 2012, quando tive que ir ao consulado chinês nada menos que quatro dias seguidos para, enfim, conseguir o meu visto de jornalista. Foram quatro dias chegando às 6h e saindo depois das 13h. No último dia, com o visto nas mãos, jurei que nunca mais iria para Xangai. Aquela seria minha despedida.
Cheguei em Jiading, a cidade onde fico, na terça à noite, morta da viagem. No dia seguinte, acordei cedo (#obrigadajetlag) e resolvi ir ao supermercado da cidade comprar alguns itens básicos de sobrevivência.
Mas resolvi que iria de mente aberta, para enfim conhecer Jiading e um pouco mais da China. Passei por jardins encantadores, templos antigos, lugares mágicos. Passei também por ruas sujas, becos estranhos. Cheguei no hotel fascinada.
Naquela mesma noite, descobri que no hotel em que eu ficava há anos havia um restaurante japonês que eu nunca tinha ido. Resolvi experimentar. Metade do paddock estava lá. A comida era incrível, barata e a companhia melhor ainda. Fui dormir às 7h depois de conhecer pessoas que hoje são minha família fora do Brasil. Pessoas sem as quais hoje eu não me imagino na F-1 e que fazem com que o tempo longe de casa passe sem que eu perceba.
Foi aí que deu o clique. Foi a partir daí que o GP da China, para mim, passou a ser um dos mais esperados da temporada. Passei a ver a China com outros olhos. Abri minha mente e meu coração para o país e hoje vejo como em oito anos eles evoluíram. Algo que, infelizmente, não vejo acontecer no Brasil.
Falar inglês hoje já não é um problema. É possível comer, pegar táxi, fazer compras sem grandes dramas. O transporte público é eficiente. As coisas funcionam. A China andou para frente. E eu, me rendi à China.
Tomara que, assim como no Bahrein, a corrida deste domingo nos faça gostar ainda mais de tudo isso aqui.