Trabalhadores no Buddh International Circuit (Eugene Hoshiko – 27.out.11/Associated Press)
Em nenhum outro país do calendário o contraste entre o ambiente asséptico da F-1 e a realidade caótica do lado de fora do circuito é tão grande como aqui na Índia.
Da primeira vez que vim para Greater Noida, a cidade onde fica o Buddh International Circuit, em 2011, para hoje pouca coisa mudou. Alguns hotéis a mais surgiram, mas a realidade indiana continua a chocar o ambiente pasteurizado da categoria.
Vir para a Índia não é uma experiência para qualquer um. Não à toa este é provavelmente o GP que tem mais ausências de colegas jornalistas em toda a temporada. Nem a chance altíssima de Sebastian Vettel ser campeão no domingo mudou este cenário.
Se no Brasil a gente reclama da burocracia, aqui é muito pior. Para comprar um simples chip paro o celular é preciso de uma foto 3×4, cópia do passaporte, nome do pai, da mãe. Só falta o do cachorro.
Se no Brasil a gente reclama do trânsito, aqui é muito, mas muito pior. Costumo brincar que o trânsito em Delhi é uma mistura de São Paulo + Xangai + Istambul.
A poluição faz doer a garganta e os olhos. Mas a Índia não é só isso, claro. As cores, os cheiros e os sabores são muitos e muito ricos. O povo, apesar de viver muito perto _e muitas vezes abaixo da linha da pobreza (25% da população)_ faz questão de estar sempre bem vestido, arrumado, colorido.
Lembro que no primeiro ano da F-1 aqui, as equipes chegaram para montar seus escritórios e encontraram famílias inteiras morando no local. Havia esgoto a céu aberto no paddock, cheiro de fezes na torre de controle e até um morcego invadiu a sala de imprensa.
Os pilotos, que em geral não se “arriscam” continuam se isolando no luxuoso hotel que fica ao lado do circuito. Mas Sebastian Vettel não anda mais com uma garrafa de uísque para cima e para baixo para fazer bochechos e Nico Rosberg não coloca mais esparadrapo na boca para tomar banho sem beber água. Os potinhos de álcool em gel pelo paddock também diminuíram consideravelmente.
Mas então por que a Índia está deixando o calendário da F-1 no ano que vem _e muito provavelmente para sempre?
Preconceito? Não.
Primeiro porque o público não conhece o esporte. A Índia é o país do críquete e automobilismo ainda não é um esporte de massa por aqui. Nas ruas, pouco se vê para promover a corrida de domingo. Na TV e nos jornais, a cobertura também não empolga.
Segundo porque os ingressos são muito caros para a realidade da população.
Terceiro porque apesar do alto investimento para construir o circuito (US$ 400 milhões), o projeto de transformar Greater Noida num grande polo esportivo também não decolou ainda.
Quarto porque todos os anos há uma queda de braço entre governo, organização e times por conta dos altos impostos que a Índia quer cobrar para as equipes correrem.
“Não fomos capazes de nos vender adequadamente. Não convencemos as empresas indianas do potencial da F-1. Podemos contar em uma mão a quantidade de empresas que estão na categoria desde que viemos para a Índia. De alguma maneira falhamos de maneira coletiva nesta corrida”, resumiu a indiana Monisha Kaltenborn, chefe da Sauber.
Triste, mas é isso.